O
Supremo Tribunal Federal (STF) apagou de seus registros de processos 89
das cerca de 330 ações penais propostas contra autoridades desde 1990. O
expurgo no sistema de acompanhamento processual foi determinado pelo
presidente do STF, ministro Cezar Peluso, sob a justificativa de impedir
a violação da intimidade dos réus. Foram retirados casos que deram em
absolvição; ações que demoraram a ir a julgamento e o crime prescreveu; e
até ações que foram remetidas a outras instâncias do Judiciário porque o
réu perdeu o direito a foro privilegiado.
Para
descobrir a lacuna, O GLOBO fez um levantamento de todas as ações penais
abertas de 1990 até dezembro deste ano. Alguns números que identificam
os processos não apareciam. São casos que já passaram pela Corte. As
ações que ainda tramitam no Supremo permanecem disponíveis para
consulta.
A partir
de julho de 2010, depois de analisar e atender a um pedido
administrativo para retirar do site um inquérito já arquivado, o STF
passou a adotar o entendimento para os demais processos criminais. Ou
seja, o “nada consta” das certidões, previsto na resolução 356, passou a
valer como um “nada a constar” no site da Corte. Sequer o número do
processo aparece no sistema público de acompanhamento do STF. Com isso,
não é mais possível procurar a ação no sistema onde são informados os
nome dos réus e toda a tramitação da ação até a última decisão proferida
pela Corte. Todos são processos públicos.
A lista
dos casos retirados foi enviada ao STF pelo GLOBO, indagando os motivos
do sumiço. Após a consulta, a assessoria de imprensa do STF reconheceu
que, em função de um erro de interpretação da resolução 356, parte das
ações tinha sido excluída indevidamente.
Tribunal alega evitar violação de intimidade
Após o
Supremo Tribunal Federal (STF) receber do GLOBO a lista da ações
desaparecidas, e admitir que houve erro de interpretação da resolução,
31 das 89 ações expurgadas voltaram a aparecer no site do tribunal para
consulta. A maioria era de ações que deixaram de tramitar no STF porque o
acusado não era mais ocupante do cargo público que tinha dado direito
ao foro privilegiado. Outras tinham sido novamente autuadas como
inquérito.
Mas 58
ações penais continuam sem constar no sistema de registro de processos
do STF. A assessoria de imprensa do tribunal informou que elas não
aparecem justamente por conta da interpretação que foi feita da
resolução 356.
“Não é
razoável que as consultas por meio eletrônico revelem dados que nem
sequer por certidão se poderia obter. Haveria, de outro modo, violação à
intimidade. Como se vê, a impossibilidade de visualização de processos
na internet, nesses casos, decorre de interpretação lógica, pois não há
sentido em que sejam disponibilizados dados que o STF não está
autorizado a fornecer oficialmente, porque não passíveis de valoração
jurídica”, informou a assessoria, em resposta a perguntas enviadas pelo
jornal.
- Lutamos
por transparência e o Supremo vai na contramão. Assim fica mais difícil
exercer o controle social – contestou Jovita Rosa, uma das dirigentes do
Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), que idealizou a Lei
da Ficha Limpa.
Ação contra deputado permanece de fora
Para
Jovita, esses processos envolvem pessoas públicas e, portanto, o
registro deles não pode ser suprimido. A direção do STF alega que
pessoas inocentadas poderiam ser prejudicadas pelo uso indevido da
informação de que já foram processadas.
Na lista
dos casos que permanecem de fora está, por exemplo, a AP 527. Motivo: o
réu, um deputado federal, foi absolvido e o registro desta ação não é
mais passível de consulta pública pelo sistema de acompanhamento
processual.
Na
presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – instância à qual o
STF não está subordinado -, Cezar Peluso editou no ano passado uma outra
resolução, a 121, que estabelece regra diferente. Processos que deram
em absolvição devem, sim, estar disponíveis para consulta pública. Mas
essa consulta só pode ser feita pelo número da ação. No caso da AP 527,
nem isso é possível. A assessoria do STF informou que Peluso pretende
discutir com os demais ministros uma adequação entre as resoluções do
CNJ e do Supremo, e que as duas instâncias são colegiados diferentes,
com atribuições diferentes.
Jornal o Globo
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