por Davi Lambertine
Cerca de 30 travestís paraibanas podem ser vítimas do tráfico de humanos para a Itália. A estimativa é do procurador chefe do Ministério Público do Trabalho na Paraíba, Eduardo Varandas. O Governo Federal vai investigar a existência de quadrilhas agenciadoras no Estado e em outras localidades do Nordeste. Por isso, embarcaram ontem para Roma funcionários dos ministérios da Justiça e das Relações Exteriores e das secretarias de Mulheres e Direitos Humanos. Eles participarão de reuniões com autoridades italianas para tratar do assunto.
“O tráfico de humanos também está associado ao de drogas, a condições de exploração sexual e escravidão. Previmos que haja cerca de 20 a 30 travestís paraibanas estão nessa situação. São pessoas que têm seu passaporte capturado, trabalham até por 12 horas seguidas em ‘programas’, dormem em quartos com 20 pessoas, têm obrigação de ter uma média de produtividade mínima de 800 Euros, e quando não atingem esse valor, são impedidas de voltar pra casa e chegam a sofrer castigos corporais”, salientou Eduardo Varandas.
A missão diplomática do Governo Federal surgiu através de denúncias e pedido de intervenção através do procurador chefe do Ministério Público do Trabalho na Paraíba, Eduardo Varandas, Polícia Federal e Ministério Público Federal. Ele se reuniu em dezembro do ano passado no Itamaraty, em Brasília (DF), com a diretora do Departamento Consular e de Brasileiros no Exterior, a ministra Luiza Lopes da Silva. Uma quadrilha que agia com tráfico de mulheres na Espanha já foi desarticulada.
Pessoas aprisionadas
De acordo com Eduardo Varandas, as travestis acabam sendo escravas de um ciclo vicioso, em que 80% do que conseguem com seu trabalho é repassado para o explorador e 20%, serve para pagar dívidas e despesas. “São escravas de um ciclo vicioso que não acaba fácil. O tráfico parte da premissa do engano, 80% delas vão enganadas e pensam que ganharão mais, ou terão melhores condições de vida.
“Essas pessoas acabam também sendo obrigadas a transar sem camisinha, a consumir drogas ou a traficar entorpecentes também”, acrescentou. É muito comum elas envelhecerem e começarem a traficar drogas. Uma boa parte delas começa a aliciar menores pobres no Brasil a serem vitimas desse ciclo de miséria. Transforma vitimas em vilões num sistema de corrupção generalizado”, destacou Eduardo Varandas.
Falta dignidade
De acordo com Eduardo varandas, o Brasil é o país que mais exporta travestis para o mundo. “Que escolha elas têm permanecendo no Brasil? Não oferecemos trabalho digno, proteção social, políticas públicas voltadas para a diversidade. Na prática, elas são expulsas, maginalizadas e escanteadas por causa das desigualdades e da cultura hipócrita que temos. Alguém já viu alguma atendendo no comércio em João Pessoa?”, indagou o procurador.
De acordo com ele, elas vão para outros países fazer, de certa forma, o que também fazem no Brasil, mas de forma diferente. “No Brasil elas apanham, são obrigadas a fazer sexo sem camisinha, a usar drogas, a transar com policiais em troca de livre utilização do ‘ponto’ onde atuam, dentre outros”, elencou Eduardo Varandas. Enquanto no país, elas ganham de R$ 20 a R$ 30 em um programa, na Europa esse valor sobre para 100 a 150 Euros.
Correio denunciou esquema em 2005
O esquema internacional de aliciamento de jovens travestis paraibanos para a prostituição na Europa foi denunciado pelo Jornal Correio da Paraíba em duas reportagens especiais da jornalista e Santiago. As publicações são de 20 de fevereiro de 2005 (“Gays voltam ricos da Europa, influenciam e ‘exportam’ jovens”) e em 29 de outubro de 2006 (“Garotos da Paraíba são aliciados e levados para o Exterior”).
Segundo as reportagens, a rede aliciava e agenciava jovens de vários municípios da Paraíba, como Araçagi, Guarabira, Mulungu e Baía da Traição e os “levava” para exercer a prostituição na Europa, principalmente na Itália.
Na época, o promotor Marinho Mendes fez uma denúncia e a Polícia Federal investigou o esquema.
denúncia afirmava, inclusive, que um adolescente, de 17 anos, havia sido levado para a Itália para ser explorado sexualmente pela rede. Segundo as reportagens, os jovens chegavam à Itália devendo até R$ 50 mil e pagavam o dobro aos agenciadores.
Entre os jovens paraibanos acompanhados pela reportagem estavam Emerson da Cruz Batista, a “Yasmim”, na época com 17 anos e o irmão, Jean Carlos Batista, a “Geovana”. Yasmim foi aliciada e levada para a Itália, onde também teve que pagar ao seu aliciador uma quantia em dinheiro oito vezes maior.
Em depoimento à Polícia Federal, em setembro de 2009, José de Arimatéia Junior, ou “Isabella da Roma”, confessou que ajudou Yasmim a ir para a Itália, pagou para ela as passagens aéreas e emprestou 500 euros e “que posteriormente recebeu de Yasmim aproximadamente quatro mil euros”.
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